Os Exemplos arrastam mesmo?
Todos já ouvimos lugares-comuns como:
“As palavras ensinam, os exemplos arrastam.”
Esse tipo de afirmação tem, geralmente, dois efeitos contraditórios em nós:
- Eles parecem verdadeiros, pois, de fato, os exemplos parecem ter grande efeito sobre nós.
- Por outro lado, parecem falsos, pois, se fossem verdadeiros, o mundo seria perfeito, sendo que existem exemplos de boas pessoas aos montes por aí, não?
A resposta que resolve esse problema é simples: não são quaisquer exemplos os que arrastam, mas um tipo particular de exemplo.
O Problema das Ideias
Para entendermos melhor que tipo de exemplo é esse, primeiro temos de lembrar um aspecto sobre a virtude que já explicamos em outro artigo. Não vou discorrer novamente sobre o assunto, mas vou deixar o link para que você possa ver o artigo original
Basta para o presente tema lembrar que a Virtude não é apenas um hábito, mas um hábito consciente. Significa que não adianta que eu apenas me acostume com uma ação. É preciso que eu entenda por que essa ação é boa e deseje esse hábito voluntariamente por saber que ele é bom.
Sendo assim, fica evidente que, para ajudar alguém a desenvolver virtude e decidir-se por repetir as difíceis ações que levam ao hábito, é necessário primeiro convencê-la de que aquilo é realmente bom.
Mas aí mora um problema: as ideias, os conceitos, ou seja, aquilo que usamos para convencer o intelecto, são muito frios para conseguirem, sozinhos, moverem os afetos das pessoas.
A ideia é abstrata demais! Por mais que a pessoa entenda, ela não tem a força motora interna necessária para dar passos na direção da mudança. Principalmente se esses mesmos passos vão contra seus desejos afetivos.
Por isso, é preciso usar uma estratégia: é preciso mover também os afetos. E é aí que entram os Exemplos.
A Emulação
Acontece que simplesmente realizar uma ação ordenada na frente de uma pessoa não garante em nada que ela vai se mover para imitar.
Agora, quando alguém que essa pessoa admira, alguém que ela considera fantástico e interessante, alguém que ela acompanha com atenção, quando esse indivíduo realiza uma ação ordenada na frente dessa mesma pessoa, aí sim vemos mobilização. Por quê? Porque essa pessoa já tem afetos potentes que a movem na direção daquele indivíduo. Sua admiração por ele gera nela uma virtude muito particular: a Emulação. Emulação é o hábito de desejar imitar aquilo que vemos de nobre nos outros.
Em palavras mais simples: o menino não apenas gosta do Herói. Ele quer SER como o Herói. Quer imitá-lo. Usa roupas parecidas. Coloca uma máscara semelhante. Ele imita suas virtudes. Esse tipo de exemplo, sim, arrasta. E isso é muito interessante, porque mesmo alguém que não tem linguagem o suficiente para entender um conceito consegue entender a admiração por um Herói. Vemos isso nas crianças o tempo inteiro.
O que isso significa? Que enquanto não é possível uma consciência perfeita, a Emulação serve como um substituto válido para ela no que concerne à Virtude. A criança pode ainda não entender intelectualmente o que é a Coragem, mas se ela deseja real e voluntariamente ser corajosa como o Pedro das Crônicas de Nárnia, o crescimento na Virtude já começou! Essa é a importância dos exemplos. Veremos agora quatro fontes deles que são muitíssimo interessantes.
A Imagem dos Heróis como exemplo!
A primeira fonte é uma das mais interessantes para os formadores: a Literatura. Perceba-se que é a menos nobre das quatro. No entanto, é justamente por ser a menos nobre que ela é a mais eficiente no começo da formação.
Entenda: no começo, todos nós somos mais afetivos que espirituais. Isso significa que aquilo que move diretamente os afetos é mais potente nessa fase do que aquilo que convence a Inteligência ou move a Vontade. E a literatura, de fato, tem um poder maior de mobilização dos afetos, pois ela é, em sua essência, Arte. Ou seja, ela é uma técnica aperfeiçoada por milênios que visa o encantamento através da Beleza.
É óbvio, todas as fontes de exemplo das quais trataremos adiante trazem Verdades mais nobres. Mas deve-se entender que a função delas não é encantar ou atrair, mas, sim, simplesmente professar a verdade. Assim, no quesito de mobilização afetiva, a Literatura vence. Quando lemos um bom livro, temos contato com as mesmas verdades morais e espirituais das ciências superiores, mas esse contato é na forma de imagens belas, interessantes, encarnadas em personagens cativantes, heróis inspiradores e vilões repulsivos. Isso tem um poder especial sobre a nossa alma. Por essa razão, é indispensável escolher boa literatura que tenha exemplos não só moralmente ricos, mas que estejam encarnados em heróis fascinantes e maravilhosos.
Além disso, é interessante também compreender bem as imagens morais escondidas nos bons textos. Quanto mais se conhece intelectualmente, melhor eles servem como alicerce para a virtude real.
Caso, você queira conhecer as mais belas obras da Literatura, visite nossa Livraria!
Os Exemplos dos Santos
Mais nobres que as imagens dos heróis fictícios são as imagens dos heróis verdadeiros, dos quais os mais elevados que existem são os santos e santas que serviram a Deus com suas vidas e, não raro, com suas mortes. Nos santos vemos mais do que apenas virtudes humanas. Vemos homens e mulheres que conversavam diariamente com o Criador do Universo e tomavam a decisão consciente de viver de acordo. Eram pessoas que tinham pelo que viver porque tinham pelo que morrer! Não sejamos tímidos com relação a oferecer a vida dos Santos a nossas crianças.
Muitas vezes, somos acovardados pela pressuposição de que as histórias dos santos são chatas e tediosas. Até que você esbarra com a história de São Bonifácio derrubando um carvalho com as próprias mãos porque sacerdotes pagãos faziam sacrifícios rituais à árvore. Ou quando descobre São Padre Pio voando e desviando bombas na Segunda Guerra! Pois é! Será que as histórias dos Santos são chatas ou será que nós não as conhecemos muito bem? O amor que se adquire pela história de um santo vale mil vezes aquele que se tem por um herói! O santo é real. O santo tem uma virtude mais perfeita. O santo nos conduz a Deus com seu exemplo.
O Exemplo do Cristo
Dito tudo isso, a imagem exemplar por excelência é a de Cristo no Evangelho.
“Ecce Homo” (Eis o Homem)
– Pôncio Pilatos
disse Pilatos, profeticamente sem saber. Eis o homem como ele deveria ser! A imitação de Cristo é o fundamento da vida cristã. Ele é o exemplo que os santos seguiam em primeiro lugar. No entanto, existe um problema em oferecer o exemplo de Cristo às crianças: é importante que aquele que o apresenta o conheça de verdade. Se aquele que apresenta o Senhor o faz com a apatia de um burocrata ou o constrangimento de um desconhecido, como pode esperar gerar encantamento em quem o escuta?
Cristo no Evangelho não é um pedaço de texto. É uma Pessoa viva com quem é possível se relacionar! Buscar imitar a Cristo sem ter um relacionamento profundo com Ele é um contrassenso. Por isso, é necessário, mesmo, ter cuidado quando se fala em imitar as virtudes de Cristo. Ele é muito mais do que um estereótipo moral. Ele é o Deus vivo e verdadeiro que nos chama a viver com Ele!
A verdadeira imitação de Cristo só é possível na Graça.
O Exemplo do Pai
Por fim, temos a imagem à qual o próprio Deus escolheu se associar ao nos ensinar a chamá-lo de Pai. A Imagem que escolheu ao nos dar uma Mãe.
Você já pensou que, quando seu filho pensar em Deus, é o seu rosto que ele vai ver?
Isso significa que, sim, pais e mães, o mais importante e precioso exemplo que seus filhos vão ter será o dos senhores.
Serão vocês:
- Que lhes apresentarão bons livros e bons professores.
- Que lhes introduzirão na vida dos Santos.
- Que vão levá-los ao altar do próprio Deus.
Por essa razão, quando você se esforça por ser bom, ser REALMENTE bom, você não o faz apenas para sua salvação.
Existe alguém que está olhando para você. E não se engane: eles estão olhando para você!
A despeito das birras adolescentes. Apesar dos atritos e rebeldias, você será sempre o ponto de referência para onde ele sabe que pode retornar. Um porto seguro em meio às tempestades.
Que responsabilidade imensa e maravilhosa! Que Nosso Senhor nos faça dignos dela. Nos faça Exemplos. Nos faça Santos.
Se você não sabe por onde começar sua formação nessa missão, recomendo que dê uma olhada em nosso curso: o Recomeço. Vou deixar o link aqui embaixo:
Escrito por Prof. João Gabriel
1 Comentário
Your comment is awaiting moderation.
[…] possível “antecipar” esse conhecimento por aquilo que chamamos de Emulação (ver o artigo “Exemplos Arrastam… será?” […]
Olá!
Seu trabalho é muito profundo! Parabéns pela dedicação à Verdade!